sexta-feira, 12 de outubro de 2018

Casa de Madeira


 As vezes você acorda e é uma árvore. As memórias são pequenos corvos, bagunceiros, que voam  de forma confusa. Pequenas penas caem e viram novas árvores e então você entende que não existe presente. As raízes estão lá, firmes e fortes, podres e frágeis. Uma lâmina fria te atravessa. Pode ser um machado mas é a curva do ponteiro. A terra fofa te suporta, te acolhe, esmaga seus passos.
A queda deveria funcionar como algum tipo de alívio. Algumas partes suas são roubadas e viram coisas. Sempre vira outra coisa que em você formava um inteiro. Uma cadeira capenga onde uma velha irá contar histórias. Uma vara de pescar tosca, com cordinha e anzol, para não pescar nenhum peixe. Apenas conseguir sentir a correnteza. Os corvos não entendem o fracionamento e voam para longe. A lona da barraca tremula com o vento que anuncia a chuva. As vendas irão cair, mas é feriado. Angústias. Histórias. Previsões. Não é possível achar contrapontos. O silêncio interrompe tudo. Uma batida de carro, um gol na praça, o cigarro enrolado, a sede e o suor. A música conforta e a árvore vira carvão, mesa, placa. Vira farelo e esquecimento. E a lâmina fria das horas corta mais um pouco. O grito forma farpas. As folhas adornam o chão e outros pés cantam. O som de cada folha trás um sorriso. Roda de madeira não fura. Roda de madeira não fura. Roda de madeira não fura. Ela quebra. Aro de madeira. Quebra. Carroça de madeira. Quebra. Memórias de madeira. Quebra. Casa de madeira. Quebra.

Nenhum comentário:

Postar um comentário